Extremos da Tolerância Humana

sábado, 27 de junho de 2009

A água pede passagem

Durante muito tempo, pesquisadores não conseguiam explicar como se dava a passagem rápida de moléculas de água através da membrana plasmática. Imaginavam que essas, sendo componentes de grande parte das reações metabólicas celulares, tinham passagem livre através da parte fosfolipídica (depois, claro, das teorias sobre esta composição) da membrana.
Em meados da década de 80, Peter Agre, Doutor em Medicina e professor de medicina bioquímica na John Hopkins Medical School, estudava o fator Rh das hemácias quando descobriu uma proteína desconhecida (achava ser um contaminante), abundante na membrana dessas células. Posteriormente, reconheceu as mesmas proteínas em células renais e no parênquima de plantas. Em 1992, foi identificada uma maquinaria molecular que facilitava o movimento da água. Agre percebeu, então, que havia descoberto o motor daquela. Fez diversos experimentos comprovando a diferença entre células com e sem essas proteínas em soluções aquosas diversas, mostrando que as possuidoras destas sofriam efeitos bem maiores de osmose. Após sequenciar esses "canais de água" e decifrar sua constituição tetrâmera, Agre foi pesquisando sobre as diversas funções dessas proteínas e simultaneamente lançando suas descobertas ao mundo científico, até que em 2003 recebeu o Prêmio Nobel de Química.



Hoje, sabemos que as aquaporinas são proteínas integrais das biomembranas de algumas células, não só de animais. Funcionam como poros à passagem de água, mas também permitindo que moléculas menores e também polares, como o glicerol, o atravessem (dependendo do tamanho do poro). A seletividade destes ao H2O é feita pela pelo filtro aromático-arginina, o qual forma, no centro do poro, uma carga positiva favorável à orientação da molécula de água (figura acima). Aliada à passagem estreita, tal característica faz a seleção hídrica, excluindo, principalmente, íons e prótons (mesmo na forma de hidrônio H3O+).

Até agora foram descobertas 13 aquaporinas em mamíferos, sendo 6 presentes nos rins, esboçando a importância da rápida movimentação da água nesses órgãos, que têm a responsabilidade de filtrar o sangue e reabsorver o excesso de água da urina. Para tanto utilizam-se desses poros principalmente em seus ductos coletores (nos glomérulos de malphigui), onde se tem a maior taxa de reabsorção. As aquaporinas que mais contribuem para isso são a AQP-1 (reaponsável por 70% da reabsorção hídrica) e a AQP-2 (10%). Essa última é especialmente importante por ser ADH-dependente, ou seja, necessita desse hormônio para ser liberada da vesícula citoplasmática onde fica armazenada, fundindo-se, então, com a membrana celular e realizando sua função de transporte (tais mecanismos já foram descritos na postagem "Que Sede!"). Pessoas com deficiência na produção desse hormônio ou na expressão da AQP-2 possuem Diabetes Insipidus. Abaixo a figura mostra o funcionamento de algumas aquaporinas (clique em cima dela para visualizar melhor):


Agre propôs ainda que, futuramente, quando as aquaporinas puderem ser manipuladas, problemas médicos como edemas cerebrais e outras retenções hídricas patológicas poderão ser facilmente resolvidas. Curiosamente, uma pesquisa constatou que esses poros aumentam a invasibilidade tumoral e as metástases, em casos de câncer. Com a utilização da substância Acetazolamida, há muito conhecida como antidiurético de ação leve, conseguiram inibir a expressão das aquaporinas, diminuindo aquelas características de células cancerosas. Descobiu-se, portanto, na Acetazolamida, uma alternativa ao combate ao câncer, e, nas aquaporinas, um novo alvo terapêutico promissor.

O vídeo abaixo mostra, simplificadamente, o mecanismo das aquaporinas (vídeo do próprio Peter Agre):





Referências Bibliográficas:
- http://www.ufmt.br/bionet/curiosidades/15.09.04/aquaporina.htm
- http://www.medicinacomplementar.com.br/tema070108.asp
- http://en.wikipedia.org/wiki/Aquaporin
- http://www.bio.miami.edu/~cmallery/150/memb/water.channels.htm
- http://nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/2003/animations.html

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posted by Vinícius Alves Bezerra at 23:24

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